PARA DIALOGAR COM OS AMIGOS BRANCOS


Se você é uma pessoa preta, brasileira e não nasceu em uma comunidade quilombola, há grandes chances de você ter pessoas brancas ao seu redor em espaços sociais que costume frequentar. Talvez esse número de pessoas de pele clara nem seja tão significativo, mas eu preciso te alertar que basta uma pessoa branca no recinto pro jogo ficar desigual.

Caso você seja alguém minimamente inseride no debate racial, certamente já sofreu algum tipo de retaliação por se posicionar contra o racismo. Não tô falando isso sem conhecimento de causa, mas como fizemos um acordo nesta coluna, me sinto na obrigação de te dar algumas dicas pessoais que poderão te auxiliar no trato com a galera branca, que ultimamente adora ostentar a carteirinha com o “selo antirracista”. Aliás, qual a organização que tem liberado desordenadamente este “selo”? Bom, isso é papo pra outra coluna. Voltemos ao assunto, pois não quero perder o fio da meada.

Desde o dia 02 de junho deste ano (2020), quando as redes sociais foram mundialmente tomadas pela campanha #BlackOutTuesday, que muita gente começou a se dizer antirracista por aí. Uma das grandes questões nisso tudo é que tem gente que até hoje não sabe porque colocou uma tela preta em seu próprio instagram, mas como grandes campanhas sociais geram um efeito em cadeia, muita gente branca se sentiu na obrigação de aderir apenas pela manutenção de sua audiência. OBS.: Meu sobrinho Aladê Koman, um menino preto retinto, de 12 anos de idade, disse que muita gente colocou a tela preta apenas pra “surfar no hype”, e depois de pesquisar um pouco, pois eu não conhecia esta expressão, eu tive que concordar com ele, porque a onda foi bem essa.

O cerne da questão é: o que é ser antirracista exatamente? Existe uma cartilha única com as prerrogativas necessárias? Pra começo de conversa, dê uma dica aos amigos brancos: Leiam autoras e autores negros. Leiam ainda com mais afinco àqueles que trazem a questão racial como assunto primordial.

Minha opinião (apenas), porque não trago aqui nenhuma verdade absoluta, é que existem pessoas brancas que estão num caminho antirracista, mas não que já possam usar este termo como sobrenome. É que se no Brasil o racismo se apresenta como estrutural, e essas pessoas estão inseridas nessa estrutura, como poderiam ser de fato antirracistas? O fato é que o racismo é tão cruel, que tem gente que até quer se dizer aliade da luta contra o racismo, mas não quer abrir mão de seus privilégios. Há também àqueles que vivem reproduzindo falas e atitudes racistas, mas ao serem interpelados colocam a culpa toda na sociedade e seguem com a promessa de que jamais repetirão o erro. No fim das contas resolvem o crime (porque SIM, racismo é crime inafiançável) com um pedido de desculpas. Esses não são os únicos tipos de racistas existentes, mas eu quis trazer esses dois como exemplo pra facilitar nosso debate.

Se ao ser acusado de racismo por outra pessoa, seu amigo usa seu nome como prova de que não é racista, ABRA SEU OLHO, porque essa prática é bem antiga e traz benefícios pra muita gente, menos pra você.

Quando você começa a se apropriar do debate racial e resolve não mais engolir calade o racismo que te acompanha há tanto tempo, e seu grande amigo branco diz que você mudou e que tá muito difícil lidar com você, CORRA! Porque na verdade ele tá percebendo que a

relação de vocês está deixando de ser vertical, e branco em sua maioria não consegue mesmo lidar com isso.

Se você relatar pro seu amigo branco que sofreu racismo e que pretende botar a boca no trombone, e ele tentar te demover da ideia, justificando que todo erro tem perdão, NÃO RECUE. Só você sabe o tamanho das suas feridas e o quanto denunciar é importante individualmente e coletivamente.

Se seu amigo branco acha super normal ter uma porção de amigos, mas o único preto ser você, SE LIGUE! Talvez essa amizade tenha mais interesses do que qualquer outra coisa.

Se você traz uma reflexão pessoal pro seu amigo branco e ele diz que você tá errade, justificando com uma fala totalmente oposta, vinda de outra pessoa preta, eu te pergunto: POR QUE VOCÊ AINDA TÁ INSISTINDO NESSA AMIZADE?

O que eu quero que você saiba é que nenhuma reivindicação sua (ainda que tardia) por igualdade de direitos e acessos pode ser descartada ou relativizada. O Brasil foi construído a partir da escravidão de pessoas pretas, o que mostra que ele foi pautado no racismo, e se você enxerga isso, você tem todo o direito de mudar o curso dessa história e de mostrar pros seus amigos brancos que só existirá caminho antirracista quando eles entenderem que essa conta será debitada única e exclusivamente da branquitude. Mas se posicionar às vezes é um fardo bem pesado, e é por isso que tô aqui pra te dizer: essa luta não é só sua, você não está sozinhe nesta batalha. Nossos mais velhos vêm trilhando essa estrada pra gente há tempos e se muitos deles são símbolos de resistência, nós nos enxergaremos como comunidade preta e lutaremos arduamente por nossa existência. UBUNTU!!!

Com afeto e axé, Luana Xavier.

Luana XavierAuthor posts

É atriz, apresentadora, roteirista e criadora de conteúdo. É uma das apresentadoras do programa Viagem a Qualquer Custo no GNT. Ela também é um sucesso no Instagram.

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